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O Vale do Silício e o Vale do Rio Paraná

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Foto: Eloiza Dal Pozzo

O rio que traz e leva experiências nas nossas vidas é profundo. O rio do jovem que vive na fronteira tem sido raso e parado.

Há inúmeros estudos que apresentam dados sobre a maior vulnerabilidade dos jovens que vivem em regiões de fronteira (IDESF 2014, 2015, 2018); (INSTITUTO SOCIAL DO MERCOSUL, 2020); REIMANN (2013) e tantos outros.

Os principais fatores de risco estão ligados à necessidade de auxiliar no sustento da família e à atração do ganho financeiro rápido e fácil propiciados pelas atividades informais e ilegais, como contrabando, descaminho e tráfico de drogas.

Nesse cenário, muitas vezes o jovem é aliciado para atuar neste mercado e aos poucos começa a ser inserido na criminalidade e/ou envolvimento com drogas. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA, 2023), nas fronteiras terrestres brasileiras há um déficit de políticas públicas nas áreas de saúde, educação, segurança, moradia e trabalho.

Não é novidade.

Estive refletindo sobre a juventude e sobre as alternativas para mudanças de cenário, já que além da preservação da vida, o jovem é e sempre será o futuro. O desenvolvimento socioeconômico depende dele.

No mercado de trabalho formal, os empregadores se queixam da falta de jovens para se candidatarem-se às vagas e, uma vez contratados, há algumas reclamações sobre o comportamento da juventude, como falta de atenção e de comprometimento, ansiedade à ascensão profissional, dificuldade em lidar com a frustração e problemas de comunicação.

O salário médio de um auxiliar administrativo com ensino médio completo varia entre R$1.100,00 a R$1.400,00 (salário bruto), para 40-44 horas semanais. Com os descontos na folha de pagamento, o provento é capaz de pagar 2 cestas básicas.

Anúncios em grupos do facebook e uma fonte me falaram que para passar mercadoria pela ponte da Amizade (a cota), é pago o valor de R$ 150,00. Se passar pelo rio, um pouco mais. O faturamento vai depender de quantas viagens forem feitas.

Outra fonte me confidenciou que em uma viagem para Cascavel, para levar contrabando, um jovem ganha entre R$ 2 mil a R$ 3 mil. Já dá para estimar que o ganho imediato por meio do trabalho informal é bem maior do que o formal.

Vista da favela do Jupira, em Foz do Iguaçu, área bem próxima à Ponte da Amizade. Há condições para o jovem pensar em empreendedorismo nestes locais? / Foto: Eloiza Dal Pozzo

Ainda na análise do contexto cotidiano da vida do jovem, fiz uma pesquisa sobre os conteúdos dos ensinos fundamental e médio. No ensino fundamental, nos anos finais, a partir do 6o ano (idade adequada de 11 anos), o jovem adquire conhecimentos por meio das disciplinas de artes, ciências, educação física, ensino religioso, geografia, história, língua inglesa, língua portuguesa e matemática.

No novo ensino médio, o currículo passou a ser composto pela etapa comum, formação geral básica, composta pelas aprendizagens classificadas como essenciais nas 4 áreas do conhecimento: linguagens, matemática, ciências da natureza e ciências humanas, além dos itinerários formativos, onde cada aluno escolhe se aprofundar nas áreas do conhecimento ou realizar uma formação profissional.

Fiquei me questionando: o sistema educacional está adequado? Tudo é importante, mas me pergunto onde estão os espaços de diálogo e educação relacionados à ética, à saúde mental do jovem, à escuta e compartilhamento dos planos de vida. A escola é um espaço de conhecimento e também de socialização.

Também tenho observado e tenho contato com alguns jovens e suas famílias. Claro que eles são conectados. Estamos na geração alfa: tem afinidade com a tecnologia. Já nasceram neste ambiente. Os estímulos constantes fazem com que eles desenvolvam diversas habilidades, mas também podem prejudicar a atenção e a paciência, o que gera dificuldade de concentração e imediatismo.

Para quem faz parte da geração Z (nascidos entre 1995 e 2010): Tiktok, Instagram e outras plataformas e mídias sociais que nem conheço. O fato é que há uma vida sendo vivida no ambiente online. A natureza patrimonial, do ganho, da maquiagem, das influencers, dos procedimentos estéticos sem fim e do estilo de vida rico é o desejo.

É comum sonhar em ser rico. Minha geração também sonhava com isso. Mas há uma vida online que faz disso possível, vivendo os dias dos outros. A família tenta sustentar o conforto. Os demais integrantes da casa também gostam da bonança.

Todos gostam. Trabalha-se mais, consome-se mais, há uma dependência em olhar para o celular. Os diálogos familiares vão dividindo espaço com a vida paralela e virtual de todos os integrantes da casa. Hoje em dia, quase todos somos assim. O jovem pode mudar. Mas nós precisamos mudar também.

Por fim, acessei os planos de governo federal, estadual e municipal (para a gestão de Foz do Iguaçu a partir de 2025) para verificar em que medida a juventude é citada para ter acesso a políticas públicas.

O Plano de Governo da atual gestão federal cita a necessidade de políticas transversais para a juventude, com acesso à educação, cultura, promoção, qualificação e geração de empregos de qualidade e, ao mesmo tempo, atuação no combate ao desemprego, fome e insegurança.

No Plano de governo da gestão estadual, há ações citadas como “Fomento Paraná”, que “estuda linhas de crédito para atender jovens recém formados em cursos técnicos ou de nível superior que desejam empreender”, o “Cursinho Paraná”, para auxiliar jovens no Enem, vestibulares e demais avaliações periódicas, a “criação da Educação de Jovens e adultos profissionalizante”, o “Projeto Ciências Forenses na Escola”, para mapear os colégios estaduais para produção de indicadores sobre o uso de drogas por jovens, “readequar a Educação de Jovens e Adultos (EJA) para possibilitar a conclusão dos estudos com qualidade e em tempo hábil”, “contratação de jovens aprendizes por meio de subvenção econômica a empresas”. Além disso, há um trecho que cita “fomentar a participação dos jovens na tecnologia e no empreendedorismo”.

O Plano de governo que compreenderá a gestão municipal de Foz do Iguaçu a partir de 2025 cita:

“Programa Municipal de Residentes: oferecer oportunidades de primeiro emprego para jovens formados, com bolsas de aperfeiçoamento e preparação para o mercado de trabalho”, criação de “programas de mentoria e atividades recreativas para jovens […], organizar encontros periódicos onde os cidadãos possam compartilhar preocupações e sugerir melhorias, garantindo que todos se sintam ouvidos”.

Em que nível todas as propostas sugeridas atendem e se encaixam na realidade dos riscos de inserção da juventude nos mercados informais?

Qual a viabilidade de um jovem morador das áreas vulneráveis de Foz do Iguaçu pensar em empreendedorismo? Que tipo de novo negócio mudaria a mentalidade do jovem exposto às atividades informais?

Esse olhar de Vale do Silício não se encaixa na realidade das fronteiras. Há muitos temas que são requisitos ao “sucesso profissional”, como a vida digna, a saúde física e mental.

O Vale do Rio Paraná demanda políticas públicas para a juventude, integração e ações coordenadas entre os entes municipais, estaduais e federais.

A fronteira é diferente. Há que se pensar nela em profundidade.

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Jornalista, Doutora em desenvolvimento regional e Pós doutoranda em políticas públicas e desenvolvimento.

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