Que atire o primeiro unfollow quem nunca recorreu ao ChatGPT (ou Gemini, ou Copilot…) naquele momento de bloqueio criativo. Você lá, cheia de coisas para fazer, prazos apertados, e o cérebro… Um branco total. Zero ideias. Mais travado que o Windows ME. Não sai uma frase sequer.
Esse bloqueio é mais comum do que parece, principalmente para quem trabalha com a criatividade. Antigamente, essa era a hora em que a gente saía para tomar um cafezinho, beber uma água, dar uma volta e esperar as ideias se reorganizarem na mente. Mas, estamos em 2025.
E, sem pensar duas vezes, você abre aquela abinha do navegador e pede: “Chat, dá uma ajuda aí”. E ele dá. Cospe um texto prontinho, em segundos, como um passe de mágica. Ainda se dispõe a reformatar o conteúdo, adaptar para mídias sociais, para blogs, etc. É tentador, eu sei.
Para que vou gastar horas e fritar o cérebro tentando produzir algo que uma máquina pode fazer para mim num piscar de olhos? Bem, eis o nosso dilema aqui. Em primeiro lugar, é importantíssimo destacar que eu não sou contra o uso de IA. Inclusive, eu uso, e muito, para muitas tarefas. Além do mais, seria completamente inútil ser contra.
A IA não é mais uma novidade, é um fato. Está posto. E veio para ficar. Dito isto, o que nos cabe analisar aqui é como, quando e por que usar (ou não) essas ferramentas.
Limites legais
A primeira grande discussão sobre a IA, acredito, é a legal. Afinal, como bem sabemos, a inteligência artificial não “cria” nada. Ela se alimenta do gigantesco banco de dados que é a internet, aprendendo com tudo o que está publicado por aí, e se baseia nessas referências para te dar a resposta ou o conteúdo que você quer. Para muitas pessoas, é plágio, puro e simples.
Mas a discussão é complexa. Um exemplo recente e polêmico foi a trend das imagens transformadas em ilustrações ao estilo Studio Ghibli, que dominou as redes sociais por algumas semanas. Para artistas e ilustradores, o uso pela OpenAI (proprietária do ChatGPT) do estilo de ilustração característico do estúdio japonês, trata-se de apropriação artística.
Ocorre que, por mais que a IA não necessariamente copie conteúdos na íntegra, ela é treinada com base, entre outras coisas, em obras protegidas por direitos autorais. Por isso, fica o questionamento: até que ponto esse uso é permitido? No caso do Studio Ghibli, por exemplo, o ChatGPT não copiou as obras em si, mas o estilo.
Porém, a legislação que trata de direitos autorais ainda tem lacunas sobre a autoria da obra. Neste caso: quem é o “dono” da arte? O artista que a inspirou? Quem inseriu o prompt? Ou a OpenAI, que detém a plataforma?
No Brasil, já existem discussões em tribunais sobre o uso indevido de imagens e vozes de artistas em campanhas sem autorização, e a LGPD também entra nesse debate: quando uma IA manipula dados pessoais — inclusive fotos ou voz — sem consentimento, pode configurar violação de privacidade.
Isso reforça que, além dos direitos autorais, precisamos olhar para a proteção de dados como outro limite essencial no uso ético da tecnologia.
Questões morais e éticas
E este é um ponto crucial: as questões éticas e morais envolvidas. De um lado, temos uma massa de pessoas que, talvez, não pare para refletir sobre isso. Temos a tendência de querer estar por dentro das trends. Afinal, “todo mundo está fazendo”. Isso vai das fotos estilizadas por IA ao morango do amor. Nada de novo sob este sol específico.
Mas, quando falamos de produção de conteúdos intelectuais para fins comerciais, há sempre outras camadas. Veja: uma coisa é uma pessoa comum que pega uma foto da família e pede para o ChatGPT criar uma versão em ilustração para postar no seu Instagram pessoal. Até aí, o “prejuízo” é um.
Outra coisa é uma empresa, instituição pública ou criador de conteúdo/influencer usar a mesma tecnologia para gerar imagens para suas páginas oficiais. (Aqui, uso o exemplo da imagem, mas o mesmo pode se aplicar a texto, vídeo ou qualquer outro tipo de conteúdo).
A linha é tênue, mas, analisando friamente: empresas buscam lucro (o mesmo vale para criadores de conteúdo que vivem da monetização). Logo, é eticamente correto alimentar sua comunicação e marketing por meio de conteúdos que não percorreram os caminhos legais de direitos autorais e autorização de uso?
O mesmo vale para instituições públicas que, apesar de não focarem, necessariamente, na comercialização de bens, produtos e serviços, devem guiar-se estritamente pelo que rege a lei – e nunca por suas brechas.
Muito se fala sobre sermos “substituídos pela IA”. Mas é isso mesmo que queremos?
Criatividade: um mercado em xeque?
Um ponto bastante importante é o impacto no mercado da criatividade. Uma vez que se torna tão fácil gerar conteúdo por IA, o que acontece com os profissionais que vivem disso?
O que resultará dessa prática em termos de perda de oportunidades de trabalho para escritores, ilustradores, desenhistas, designers, fotógrafos, músicos, videomakers e toda sorte de profissionais cuja matéria-prima é a criatividade? Lembremos que estamos falando de pessoas físicas versus o império das big techs, cujas práticas dariam toda uma outra discussão.
Vejo que é nosso dever — especialmente no mercado da Comunicação — fazer um uso justo, ético, moral e legal de toda e qualquer ferramenta a que tenhamos acesso. Tudo isso passa também, é claro, pela atualização dos marcos legais. Mas é preciso discutir o tema no âmbito da educação, e propor uma reflexão mais ampla, por parte de toda a sociedade.
Afinal, a inteligência artificial é extremamente eficiente, mas ela prescinde de sensibilidade, compromisso e o principal: a subjetividade, característica intrínseca à natureza humana. Por isso, proponho a seguinte reflexão: ferramentas tecnológicas fazem parte da nossa vida. Ditam, inevitavelmente, as dinâmicas e os rumos do mundo. O futuro é inescapável.
Não há como cogitar um retorno à época analógica, enxergando de forma simplista as ferramentas digitais como vilãs. Mas, quando falamos sobre originalidade, legalidade e, principalmente, prejuízos a outras pessoas, é preciso dar uma pausa, respirar e se perguntar: Até que ponto as ferramentas nos servem, ou nós servimos a elas?
Te convido a pensar a respeito e deixar sua opinião, mas sem “colar” do ChatGPT, combinado?