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A história da fronteira registrada pela imprensa

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Museu da Imprensa Foz Economia PR
Foto: Divulgação

Foi lançado no dia 26/11 o Museu da Imprensa de Foz do Iguaçu, acervo digital que reúne jornais, revistas e publicações impressas em um resgate de mais de seis décadas de história. O acervo está disponível para consulta de forma gratuita por meio do site museudaimprensafoz.com.br

O projeto é uma iniciativa da Associação Guatá — Cultura em Movimento, com apoio da Itaipu Binacional.

“O acervo é resultado de um esforço coletivo e da generosidade dos guardiões desses conteúdos”, destaca o jornalista Alexandre Palmar, presidente da Guatá e coordenador do projeto. “São pessoas e instituições que cederam seus arquivos, demonstrando compromisso com o patrimônio cultural e histórico iguaçuense”.

Passear pelo acervo é uma atividade fantástica. Fiquei algumas horas consultando os materiais – mas é preciso dias, anos inteiros para conseguir ver tanto conteúdo interessante.

Eu diria que é uma das maiores riquezas que Foz do Iguaçu já ganhou com vistas à preservação de sua história. A imprensa conta histórias, registra fatos, e como dizia o jornalista pernambucano Geneton Moraes Neto, “fazer jornalismo é produzir memória”. 

Nesse tour pelos jornais das últimas décadas, fui em busca de algumas notícias da fronteira em cuja pesquisa vou compartilhar aqui resultados bem interessantes.

O Jornal “A notícia”, edição de 30 de novembro de 1953, aborda o movimento portuário que se instalava na cidade por causa da madeira. O movimento era crescente, e por isso o jornal passaria a compartilhar dados de exportação do produto de forma contínua. “(…) o movimento de embarque e exportação de madeiras, nosso principal produto presentemente, pelo nosso porto.

No sentido de manter nossa população bem informada a respeito desse movimento, que bem atesta o alto grau de desenvolvimento e progresso que atingimos e a crescente importância de nosso Município, passaremos a publicar, nas próximas edições, uma detalhada informação sobre o assunto”.

A edição também trouxe a divulgação das inscrições para miss Foz do Iguaçu, e informações de onde a ficha de inscrição deveria ser retirada. Além disso, uma transcrição do Guia Turístico Rodoviário de 1942, com características de Foz do Iguaçu. 

Em outubro de 1970, o Jornal de Foz noticiava que a Polícia Federal faria o cadastramento de estrangeiros na faixa de fronteira com o objetivo de regularizar a situação de aproximadamente 50 mil estrangeiros que residiam na faixa de fronteira – municípios limítrofes do Brasil com os demais países vizinhos para regularizar a permanência dessas pessoas nessas regiões. 

O Jornal de Foz noticia o cadastramento dos cerca de 50 mil estrangeiros que viviam nas cidades de fronteira.

O Jornal Nosso Tempo de 9 de junho de 1986 destacou a visita do Secretário de Indústria e Comércio do Paraná, junto a representantes locais, com a intenção de criar a mesma secretaria na cidade, a fim de incentivar a industrialização de Foz do Iguaçu, além de implantação do Centro de Comércio Exterior da cidade, “destinado a proporcionar completa orientação aos empresários da região interessados em conquistar mercado para seus produtos no exterior. Era uma publicação ção que trazia pautas relacionadas ao aniversário da cidade.

Dr. Nelson Mendes escreveu sobre os avanços e problemas na saúde de Foz e, na mesma edição, Irmã Agenora escreveu:

“Os gigantescos desafios sociais de Foz do Iguaçu” – segundo o texto, naquele ano, a cidade estava com 140 mil habitantes. A autora fez uma crítica às famílias da época, ao referir-se que a escola, além da função tradicional de ensinar, estava tornando-se mais uma instituição assistencial, compromisso que deveria ser das famílias. “Aos poucos a escola vai suprindo a alimentação da criança, trata os dentes, leva ao médico, fornece material escolar, roupa, … o que mais? O que sobra para a família fazer por seus filhos? – Que país é esse que desobriga os pais de transmitir valores, princípios e o atendimento às necessidades básicas dos filhos? Não seria muito mais humano, barato e sensato que à família se dessem as condições de oferecer todo o necessário ao desenvolvimento da criança?” A continuação do texto, ela relata diversos problemas sociais e faz uma crítica ao transporte coletivo, que, segundo Irmã Agenora, “ainda continua longe de atender à demanda da massa operária que reside nos bairros mais distantes”. 

As pautas sociais são uma constante nos jornais e é triste ver como os problemas se repetem, atravessam as décadas. No jornal Nosso Tempo, de 14 a 20 de dezembro de 1984, Juvêncio Mazzarollo conta que em um sábado ele saiu para visitar algumas favelas de Foz do Iguaçu.

Ele comenta quão constrangedor e comovente era aquele cenário e faz críticas à administração municipal.

“O primeiro dever dos poderes públicos é precisamente o de promover o bem comum (…).  A prioridade da prefeitura não pode ser outra senão a de enfrentá-la [a miséria] com determinação. Qualquer administração pública que não eleger como prioridade número um o resgate das pessoas que vivem em condições subumanas estará sempre longe de cumprir seu dever maior”. 

Outro repeteco: matéria do “Jornal Foz Hoje” de 21 a 28 de dezembro de 1979: “Buracos, vales, lama, alagamentos. A culpa é de São Pedro?”. Quer um título mais atual que esse quando se percorre as ruas de Foz do Iguaçu atualmente? Quase 50 anos depois, mesmos problemas.

Matéria do Jornal Foz Hoje de 21 a 28 de dezembro de 1979. Quer um título mais atual que esse?

Mas nem só de desânimo vivem as pautas da fronteira. 

Encontrei uma narrativa engraçada. No Jornal de Itaipu de fevereiro de 1996 se noticiava:

“Itaipu já tem um endereço na internet”. De acordo com a reportagem, “o documento [com dados sobre a construção e a atual fase de operação da Usina] chamado na internet de home page já está disponível para os usuários da rede em todo o mundo (…)”. Praticamente 30 anos depois, foi gostoso relembrar os primórdios da internet no Brasil.

Jornal de Itaipu noticia a “chegada” da Usina na internet.

O informativo da Folha de Londrina, chamado “Ponte da Amizade”, em 1994, abordava em sua capa o crescente comércio de Ciudad del Este, com a descrição das cifras que movimentava, a quantidade de agências bancárias (mais que Assunção, a capital do Paraguai) e o lançamento da licitação de uma nova ponte, que ficaria próxima ao Marco das Três Fronteiras. Segundo a matéria, a Ponte da Amizade, pela qual passavam 12 mil veículos por dia, já estava saturada.

O lançamento da licitação seria no dia 26 de julho daquele ano. Sobre o investimento na obra, narra a notícia que:

“Logo que tomou conhecimento do interesse dos governos brasileiro e paraguaio em construir a ponte, o Grupo Piraso S.R.L, de Madri (Espanha), filial do Grupo Vickers Ltd, de Zurique (Suíça), ofereceu-se para obter financiamentos junto ao Banco Mundial e outros organismos de crédito”.

A matéria detalha que a intenção do grupo era participar do projeto de construção e financiamento da obra obtendo recursos de bancos de desenvolvimento. Mais de 30 anos depois, estamos com a nova ponte prestes a ser inaugurada.

Em 1994, a notícia de que uma nova ponte seria construída entre Brasil e Paraguai, próxima ao Marco das Três Fronteiras. 

Fatos que não se resolvem com o tempo, outros que demoram, mas acontecem. O repeteco dos problemas, as alegrias e as conquistas da cidade e da região trinacional. Acessar esses arquivos é quase que uma introspecção. Refletir sobre o passado, o presente, reverenciar quem passou por aqui e deixou sua energia e também refletir: Quais serão as próximas manchetes da fronteira?

Museu da imprensa de Foz

Ressalto mais uma vez os responsáveis por este projeto, pois eles merecem nossa reverência e agradecimentos eternos. 

Realização: Associação Guatá

Apoio: Itaipu Binacional

Parceria institucional: Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná, Kunda Livraria, Associação dos Diários e Portais do Interior do Paraná (ADI-PR), Folha de Londrina, Associação Nosotros e Documentos Revelados.

A equipe responsável é formada por Alexandre Palmar, Alexandre Bogler, Aluízio Palmar, Amilton Farias, Áurea Cunha, Carol Chaim, Claudio Siqueira, Denise Paro, Douglas Furiatti, Hemily Nascimento, João Arthur de Andrade Palmar, Marcos Labanca, Paulo Bogler, Silvio Campana, Vitor do Carmo e Wemerson Augusto.

Instagram: @museudaimprensafoz

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Jornalista, Doutora em desenvolvimento regional e Pós doutoranda em políticas públicas e desenvolvimento.

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