Vivemos em uma era em que a autoestima ganhou cotação própria. Uma notificação vira moeda de validação, depositada em uma conta invisível que mede o quanto valemos aos olhos dos outros. A busca por reconhecimento virou uma espécie de mercado paralelo, no qual a atenção se negocia e o afeto se transforma em ativo.
Esses dias eclodiu o termo “ego-scrolling”: quando alguém usa aplicativos de relacionamento não para criar laços reais, mas para inflar o próprio ego com curtidas e matches. E não é um comportamento marginal: pesquisa do happn mostra que, embora pouca gente conheça a expressão, metade dos usuários já admitiu se comportar assim.
Ego-scrolling corporativo?
Se, no campo afetivo, a busca por validação já distorce interações e expectativas, no universo corporativo ela pode ser ainda mais decisiva. Afinal, quando autoestima se converte em moeda, será que o tamanho do espelho também dita a estratégia de um founder?
No artigo It’s All About Me: Narcissistic CEOs and Their Effects on Company Strategy and Performance, Arijit Chatterjee e Donald C. Hambrick mostram que o narcisismo não é apenas um traço de personalidade, mas um motor estratégico.
Líderes narcisistas tendem a escolhas ousadas e extremas: promovem mudanças drásticas, apostam em aquisições de impacto e moldam suas decisões para garantir uma plateia atenta. O resultado? Desempenhos mais voláteis, com vitórias estrondosas e fracassos igualmente memoráveis.
Em outras palavras, o mesmo impulso que leva alguém a buscar validação em curtidas pode, em escala corporativa, se traduzir em estratégias grandiosas, arriscadas e, muitas vezes, espetaculares tanto para o bem quanto para o mal.
E isso é bom para a empresa?
Depende. O que temos estudado até aqui (e fica de spoiler para as próximas colunas) é que a egotrip do founder tem, sim, um valor limitado: ajuda e quando passa da medida, cobra caro.
É a tal da curva em U invertido que os professores Tom Aabo e Nicklas Bang Eriksen encontraram ao analisar o nível de narcisismo de CEOs e a performance das empresas. Níveis muito altos ou muito baixos de narcisismo foram associados à baixa performance (por isso, o formato de U invertido).
No ambiente de early stages, a conversa vai longe. Quais egotrips de founders ajudam, e quais atrapalham, nos primeiros passos de uma empresa? Como a busca desenfreada pelo espelho é percebida por investidores?
Essa percepção muda conforme o perfil do investidor? E no fundraising, seja ela via VC, via equity Crowdfunding, créditos alternativos ou qualquer outro: o espelho e o divã são decisores (para bem, para o mal ou para os dois) ou são só acessórios?
Essas são algumas das perguntas que tenho explorado em minha tese de doutorado, cujas respostas compartilho aos poucos aqui.
Quer contribuir? Vai ser um prazer ouvir você.
Referências:
AABO, Tom; ERIKSEN, Nicklas Bang. Corporate risk and the humpback of CEO narcissism. Review of Behavioral Finance, v. 10, n. 3, p. 252-273, 2018.
CARAMELA, Sammi. Are you guilty of ego scrolling?. Vice, 28 jan. 2025. Disponível em: https://www.vice.com/en/article/ego-scrolling. Acesso em: 22 ago. 2025.
CHATTERJEE, Arijit; HAMBRICK, Donald C. It’s all about me: Narcissistic chief executive officers and their effects on company strategy and performance. Administrative science quarterly, v. 52, n. 3, p. 351-386, 2007.