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Como o tarifaço de Donald Trump pode impactar a indústria paranaense

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Foto: Gelson Bampi/Sistema Fiep

Desde 6 de agosto de 2025, a imposição de uma sobretaxa de 50% pelo governo de Donald Trump (o chamado “tarifaço”) sobre diversos produtos brasileiros tem provocado impactos diretos e significativos para a indústria do Paraná

A medida, que adiciona 40 pontos percentuais a uma alíquota que já era de 10%, atinge oito dos dez principais produtos exportados pelo estado ao mercado estadunidense, incluindo setores estratégicos como madeira, móveis, café, alimentos e pescados.

Em 2024, as exportações do Paraná para os EUA somaram quase US$ 1,6 bilhão. O setor madeireiro responde por cerca de 40% desse total, movimentando mais de US$ 614 milhões. 

Alguns segmentos, como molduras e madeiras perfiladas, são altamente dependentes do mercado americano, chegando a destinar até 97% da produção para os EUA. Setores como papel, celulose e suco de laranja foram isentos da tarifa, porém representam apenas 4% das exportações paranaenses para o mercado de Donald Trump.

A falta de mercados substitutos imediatos para muitos produtos exportados pelo Paraná agrava o cenário, ameaçando milhares de empregos, principalmente em municípios menores onde a cadeia madeireira representa até 84% do emprego industrial.

Para mitigar os efeitos, a Federação das Indústrias do Paraná (Fiep) e o governo estadual vêm articulando medidas emergenciais, como liberação de créditos de ICMS, linhas de crédito com juros subsidiados e postergação de financiamentos, buscando oferecer fôlego para a indústria atravessar a crise.

Nesta edição do Economia PR Drops, conversamos com João Arthur Mohr, superintendente da Fiep, que detalha os primeiros efeitos do tarifaço, as dificuldades para adaptação das empresas e os desafios para manter a competitividade no mercado americano diante das barreiras tarifárias, além das perspectivas para diversificação e recuperação da indústria paranaense. Confira:

Quais setores da indústria do Paraná serão mais diretamente afetados pelo tarifaço imposto pelos EUA a partir de 7 de agosto?

João: Em 2024, as exportações do Paraná para os Estados Unidos totalizaram quase US$ 1,6 bilhão. Para se ter uma ideia, as novas tarifas impostas pelos EUA afetam oito dos dez principais produtos comercializados pelas empresas paranaenses com o mercado norte-americano. Foram incluídos entre as isenções somente os setores de papel e celulose, responsável por US$ 53,8 milhões em exportações no ano passado, e de suco de laranja, que comercializou US$ 9,5 milhões. Juntos, esses dois setores representam apenas 4% do total exportado pelo Paraná para os EUA. 

Como o tarifaço deverá impactar as exportações paranaenses para os Estados Unidos, especialmente nos setores de madeira, móveis e alimentos?

João: Na indústria paranaense, a nova tarifa atinge com intensidade principalmente os produtos madeireiros, que representam quase 40% de tudo o que o estado exporta aos EUA. O setor movimentou, em 2024, mais de US$ 614 milhões em exportações para o mercado norte-americano, sendo que determinados segmentos chegam a destinar grande parte de suas produções para os Estados Unidos. Indústrias de madeiras perfiladas, molduras e outros insumos da construção civil, por exemplo, são focadas quase exclusivamente em exportação aos EUA, chegando a ter uma taxa de 97% de sua produção destinada ao mercado norte-americano. Outros segmentos, como o de madeira compensada e serrada, dedicam entre 40% e 50% de suas produções para os EUA. Com a aplicação da taxação, as empresas do setor madeireiro devem sofrer uma queda brusca nas vendas externas.

Que efeitos econômicos a indústria paranaense deve começar a sentir logo após a entrada em vigor da tarifa de 50%?

João: Diversas indústrias exportadoras paranaenses começaram a sentir os efeitos tão logo surgiram as primeiras notícias sobre a taxação. As incertezas causadas pela medida fizeram com que muitos compradores norte-americanos cancelassem contratos que possuíam com indústrias do Paraná, obrigando algumas delas a suspender os envios de produtos já fabricados e reduzir ou paralisar a produção. Tudo isso já vinha comprometendo o fluxo de caixa dessas empresas, um cenário que pode se agravar com a entrada em vigor da tarifa.


Quais dificuldades as indústrias paranaenses terão para se adaptar a essa nova realidade tarifária?

João: Essa nova realidade já vem afetando empresas exportadoras antes mesmo da entrada em vigor. O maior desafio para aqueles que já tiveram contratos cancelados é buscar meios cumprir suas obrigações, especialmente em relação à folha salarial, diante da redução de receitas causadas pela suspensão de parte ou da totalidade de suas vendas para os EUA.

Como o tarifaço poderá afetar o emprego na indústria do Paraná? Espera-se aumento de demissões ou redução de jornada?

João: Indústrias que destinam boa parte de suas produções para os EUA já estão sendo fortemente afetadas pelo cancelamento de contratos antes mesmo da entrada em vigor da tarifa. Isso já obrigou algumas delas a adotar medidas como férias coletivas e, em casos mais extremos, até algumas demissões. Caso a taxação se prolongue, existe sim o risco de aumento de demissões, a depender ainda de medidas emergenciais que estão sendo adotadas pelos governos estadual e federal.

Que medidas a Federação das Indústrias do Paraná (Fiep) e o governo estadual deverão adotar para mitigar os impactos negativos nas empresas e na economia local?

João: No dia 25 de julho, antes mesmo da publicação da ordem executiva do governo norte-americano que confirmou a nova tarifa, a Fiep já havia buscado articulação com o governo do Estado, por meio da Secretaria da Fazenda, para solicitar uma série de medidas com o objetivo de monetizar as indústrias afetadas e amenizar os impactos da taxação principalmente sobre os empregos no Paraná. Entre as ações sugeridas pela Fiep e aceitas pela administração estadual estão a liberação dos saldos de crédito de ICMS habilitados no Sistema de Controle da Transferência e Utilização de Créditos Acumulados (Siscred) e em conta-gráfica para imediata monetização; a redução do percentual de 80% para 50% para definição das empresas preponderantemente exportadoras; a criação de linhas de crédito específicas para manutenção das atividades com juros subsidiados e com acesso facilitado; a postergação das parcelas com vencimento a partir de julho de 2025 referentes a financiamentos junto à Fomento Paraná e ao BRDE para o final do contrato, sem prejuízo da contratação de novos financiamentos; e a suspensão das medidas de controle, acompanhamento, fiscalização e sanções referentes aos Projetos de Investimento do Programa Paraná Competitivo.

Em que medida o tarifaço pode comprometer a sustentabilidade futura de cadeias produtivas importantes para o Paraná, como a madeireira e a alimentícia?

João: No caso da cadeia alimentícia, alguns nichos específicos serão afetados no Paraná por terem sido incluídos na taxação. É o caso do café, do mel e dos pescados, especialmente tilápia, que são exportados também para os EUA. Já o carro-chefe das exportações paranaenses de alimentos é o setor de proteína animal, principalmente frangos e suínos. Esse segmento exporta para mais de 160 países, com isso há uma diluição dessas vendas, que não sofrem um reflexo pesado por causa da taxação norte-americana. Já no setor madeireiro, o mais afetado no Paraná, como já comentado anteriormente, pode haver um maior comprometimento, especialmente em segmentos específicos que têm forte dependência do mercado norte-americano. As indústrias desse setor geram 38 mil empregos diretos no estado, além de milhares de empregos indiretos em segmentos relacionados, como de embalagens, transportadoras e serviços de manutenção, entre outros. Em alguns municípios paranaenses, como Bituruna, por exemplo, até 84% dos empregos gerados na indústria local estão atrelados à cadeia da madeira. O impacto nessas localidades, portanto, pode ser bastante significativo. Mas o que se espera é que, com as medidas emergenciais e com as negociações que seguirão com o governo dos EUA, esses segmentos possam ganhar fôlego para recuperar seus níveis de atividade.

Que setores do Paraná tentarão redirecionar suas exportações para outros mercados e qual é a viabilidade dessa estratégia diante da nova tarifa?

João: A conquista de novos mercados não é um processo simples, podendo levar meses ou até mesmo anos. Isso porque exige uma série de passos, que vão desde a abertura de negociações com novos clientes até a adaptação dos produtos, embalagens e da logística para atender as especificações desses novos mercados. A Fiep sempre estimula e apoia as indústrias a buscarem novos destinos para seus produtos, mas em casos emergenciais essa nem sempre é uma estratégia viável.

Quais serão os principais desafios para as empresas paranaenses manterem sua participação no mercado dos EUA diante dessas barreiras tarifárias?

João: O Brasil está entre os países sobre os quais a administração norte-americana impôs as maiores tarifas. Para os produtos brasileiros incluídos nessa taxação, fica praticamente inviável manter relações comerciais com os EUA, justamente porque as tarifas impactam direta e fortemente sobre os preços desses produtos. Isso faz com que as mercadorias brasileiras se tornem menos competitivas em relação às de empresas que produzem nos próprios Estados Unidos ou em países sobre os quais foram impostas tarifas menores.

Como os impactos do tarifaço de Trump no Paraná deverão se comparar aos efeitos em outras regiões do Brasil, especialmente no Sul?

João: O maior efeito financeiro, evidentemente, será sobre o estado de São Paulo, que responde pela maior fatia das exportações brasileiras para os Estados Unidos. O Sul do país como um todo vive um panorama parecido com o do Paraná, com alguns setores específicos sendo mais impactados, como é o caso do madeireiro. Entre 85% e 90% de todos os produtos industrializados de madeira exportados pelo Brasil para os EUA saem dos três estados da região Sul, com diversos segmentos tendo forte dependência do mercado norte-americano. No caso de molduras, que são utilizadas na construção civil, mais de 95% da produção do Sul vai para os EUA. Então, segmentos como esse serão impactados, principalmente pela dificuldade em se recolocar esses produtos em outros mercados, já que seguem as especificidades dos sistemas construtivos norte-americanos.

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